O Conselho Regional de Psicologia da 15ª Região (CRP-15), através da Comissão de Direitos Humanos (CDH), convida a sociedade e os psicólogos alagoanos, cuja maioria dos profissionais em Alagoas são mulheres, à refletirem sobre as demandas, a condição e a representatividade da mulher no atual cenário histórico, social e político:
O silêncio que destrói
No entra e sai dos dias
Vejo todos os dias
Mulheres serem estupradas
Mutiladas ou assassinadas
Pra que, Porque
Será que é só um corpo
Apenas isso ? Será
É mais que isso
É bem mais que isso
É UMA MULHER
Assim como vc é Homem
Ela é Mulher, e sofre
Calada por cada violência
Que sofre, pra vc não é nada
Mas pra ela é muito, é tudo
É Dor, Tortura, Sofrimento
Silêncio.
(Fernanda Angélica Teixeira)
Mãe, filha, avô, tia, sobrinha, amiga, profissional, cuidadora… Quando se fala de mulher, sua função é sempre referenciada, mas há infinitas formas de ser mulher, em diversos grupos e cenários. Não podemos esquecer as necessidades das mulheres em seus mais diversos contextos, como a mulher negra, mulher do campo, mulher com deficiência, mulher presidiária, mulher transexual, mulher periférica. Cada uma tem sua forma de ser e se sentir mulher, no entanto, há uma vulnerabilidade social que nos une, a desigualdade de gênero.
A morte de mais de 100 mulheres em um incêndio numa fábrica de Nova Iorque, é considerado um marco na trajetória de luta pelos direitos das mulheres; mas bem antes desse acontecimento as organizações feministas já reivindicavam melhores condições de trabalho. A primeira comemoração do Dia da Mulher ocorreu em Maio de 1908, nos Estados Unidos, com uma manifestação em prol da igualdade política e econômica. A data foi oficializada em 28 de fevereiro de 1909, pelo partido socialista dos Estados Unidos com um protesto em Nova Iorque. Já em 1910 na II Conferência Internacional de Mulheres socialistas foi criada uma resolução para que houvesse uma data anual em que pudesse ser celebrado os direitos da mulher. Mas foi apenas em 1921 que a data de 8 de março foi oficializada como Dia Internacional da Mulher. No entanto, foi apenas 20 anos mais tarde, em 1945, que a Organização das Nações Unidas assinou um acordo que afirmava princípios de igualdade entre homens e mulheres. E em 1977, o 8 de março foi reconhecido oficialmente pela Organização das Nações Unidas.
No Brasil a cada, onze minutos uma mulher é estuprada, a cada duas horas uma mulher é assassinada, 503 mulheres são vítimas de agressão a cada hora, a cada dois minutos ocorre cinco espancamentos. Quando você denúncia uma violência vira estatística e cria empatia, e faz com que mais mulheres se sintam encorajadas a falar e sair de sua zona habitual do silêncio, lugar este que aprisiona, machuca, tortura e as fazem viver em um mundo de insegurança, medo e tristeza. De acordo com o site da ONU Mulheres, o tema para o Dia Internacional da Mulher, 08 de março, é “O tempo é agora: ativistas rurais e urbanas transformam a vida das mulheres”. Neste ano, o Dia Internacional da Mulher se soma ao movimento mundial por direitos, igualdade e justiça para mulheres. O assédio sexual, a violência e a discriminação contra as mulheres capturaram as atenções e o discurso público, com uma crescente determinação em favor da mudança.
O Código de Ética do Profissional Psicólogo, instituído pela Resolução CFP nº 10/2005, em seu art.10, já contempla situações de quebra de sigilo. Esta previsão já é usualmente realizada em casos de ideação suicida da paciente. No entanto, o CRP também permite a quebra do sigilo em casos de violência contra a mulher. Essa nota técnica tem como objetivo pautar orientações à categoria profissional dos psicólogos em relação a este conteúdo. A notificação de todos os casos de violência contra a mulher atendidos pelos profissionais de saúde, psicólogos e outros, em território nacional, segundo a Lei Federal nº 10.778 de 24 de novembro 2003, tanto em serviços de saúde públicos quanto privados, é obrigatória. A notificação tem fins epidemiológicos e segue um processo interno dentro da Saúde Pública, servindo para a construção de perfis pelo Sistema de Informação de Agravos de Notificação-SINAN, os quais serão utilizados na construção de políticas públicas mais eficazes.
A comunicação externa deve ser feita em situações em que a vida da mulher corra sério risco ou ainda a de seus filhos ou de pessoas próximas. Nos demais casos, o psicólogo deve trabalhar com a mulher, fortalecendo o seu protagonismo e oferecendo ferramentas para que ela tome decisões. A comunicação externa se constitui como denúncia e, diferentemente da notificação, que segue um procedimento interno, é enviada para o exterior dos serviços de saúde e aciona a Polícia, a Justiça e o Ministério Público. A comunicação externa pode ocorrer com o consentimento ou sem o consentimento da mulher vítima de violência. Com o consentimento é quando a mulher está impossibilitada de fazer a denúncia e assina um termo de autorização para que o psicólogo faça a comunicação. A comunicação externa sem o consentimento da paciente configura uma quebra de sigilo profissional. A comunicação externa deve ser feita em situações em que a vida da mulher corra sério risco ou ainda a de seus filhos ou de pessoas próximas. Nos demais casos, o psicólogo deve trabalhar com a mulher, fortalecendo o seu protagonismo e oferecendo ferramentas para que ela tome decisões.
O papel do psicólogo deve se concentrar, assim, no acolhimento, orientação e fortalecimento da autonomia dessas mulheres e, somente em situações de extrema vulnerabilidade e risco de vida, fazer a comunicação externa. Um aspecto relevante da atuação dos profissionais de psicologia é a sua articulação com a rede de proteção de direitos das pacientes, bem como o fomento do fortalecimento desta rede.
Esta rede transcende o sistema policial ou de justiça, abrangendo áreas como saúde, educação, assistência social, trabalho e renda, instituições universitárias, sociedade civil organizada, e outros órgãos específicos de atenção aos direitos das mulheres.
É importante considerar que a violência contra as mulheres, baseada no gênero, pode ser uma demanda apresentada aos profissionais de Psicologia, nos mais diversos campos de atuação, não necessariamente nos locais da rede específica de enfrentamento à violência contra as mulheres. Ao lidar com esta demanda, devemos proporcionar acolhimento, orientações e devidos encaminhamentos à rede, além do fortalecimento da autonomia. Os atendimentos devem favorecer o empoderamento dessas mulheres, processo que envolve aquisição de conhecimentos, fortalecimento da autoestima e interrupção do ciclo de violência, objetivando contribuir para a superação das desigualdades das relações de poder.
Maceió, 08 de março de 2018
GT de Enfrentamento à violência contra as mulheres.
COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DO CRP-15