ARTIGO: “Falta de Segurança cala o Mundo e o Brasil chora pelos seus Filhos”

Denise Moreira

por Denise Moreira de Almeida Barbosa*

Ligar a televisão em pleno domingo e se deparar com uma grande tragédia, um grande incêndio que ocorreu na boate Kiss, na cidade de Santa Maria no Rio Grande do Sul que infelizmente matou 236 pessoas e mais de 126 feridos em estado grave quando estas estavam no evento universitário, apenas se divertindo, é muito triste!

É uma dor muito grande, principalmente aos pais que têm filhos nesta faixa de idade ou em qualquer outra, basta apenas assistir a dor de tantos.

É lamentável ver tanta gente sofrendo, gritando, chorando e buscando a todo custo através de marretas tentando perfurar os muros para salvar vidas que se encontravam lá dentro sem ter a mínima condição de se defender, onde no momento que ocorria o incêndio, os telefones tocavam presos aos corpos das vítimas  quando tantos parentes, amigos, conhecidos necessitavam saber como se encontravam e rezavam para que estes estivessem vivos, tivessem salvos.

É lamentável assistir tantos pais, famílias, amigos sofrendo, correndo de um lado para o outro em busca de notícias. É angustiante! O problema é que muitas vezes situações como esta poderiam ter sido evitadas se houvesse mais cuidado, mais responsabilidade, mais respeito humano e se trabalhasse mais a prevenção e a segurança nesses locais fechados que aglomeram tanta gente.

Agora, encontrar apenas os responsáveis pela tragédia não responderá jamais pela tristeza e angústia de tantas pessoas que se encontram desesperadas e muito menos se fará justiça quando o fato já se revela de total indignação, injusta e cruel.

É preciso que haja Leis mais rigorosas que formalizem inspeções sistemáticas nesses lugares, que obriguem um sistema de segurança eficaz, que tenham grupos de assistências durante os eventos e que se obriguem no mínimo diversos espaços com saídas de emergências.

Mas infelizmente, aqui em nosso país, tudo é só realizado “depois”, as situações são vistas como brandas e mesmo os lugares que de imediato oferecem riscos, não são avaliados, não se analisa com intensidade e com possibilidade de acidentes, assim mesmo ganham autorização para se fazer funcionando colocando em riscos toda a população.

Será que temos sempre que passar por situações tão catastróficas para poder entender que há uma responsabilidade social desses empresários que na maioria das vezes só pensam em ganhar dinheiro e pouco estão preocupados com a segurança? Será que sempre precisamos ter que passar por este caos absoluto onde fragiliza o  psicológico quando poderíamos sim ter evitado essa tragédia?

É preciso que se entenda que os pais muitas vezes não podem dizer não aos seus filhos nesses momentos de lazer que refletem na juventude a sua participação social, a sua liberdade e autorizar ou não, não quer dizer segurança, porque os seus filhos se divertem nesses lugares com o intuito exclusivo de fomentar a felicidade e não para se associar aos desmandos e/ou impunidades, riscos, perdas, lutos. Não!!! Não é fácil se colocar na posição desses pais, das famílias, é angustiante, é lamentável!

Assistir a dirigente do nosso país, presidenta Dilma, falar emocionada que retornará ao país mediante uma reunião que estava acontecendo no Chile e chorando comunicou: “o meu país precisa de mim. Neste momento é o povo brasileiro que necessita de minha presença”. Fez questão de mencionar que irá pessoalmente monitorará a tragédia que ocorreu na boate dessa cidade de Santa Maria/RS, nos permitindo sentir um pouco de conforto, pois sabemos que haverá uma busca pela impunidade nesse momento que o mundo chora por tantas perdas, por tantas mortes.

É muito importante ver o envolvimento dos poderes, da sociedade e de profissionais que garantem neste primeiro momento a estabilidade emocional da família. Como coordenadora de uma Instituição que rege a busca pelo bem estar e saúde do trabalhador (CEREST), que emite o seu objetivo que é a segurança do trabalho e também tendo como formação a psicologia clínica, do trabalho e a psicologia das emergências e desastres, fico menos apreensiva ao saber que profissionais de minha área, psicólogos voluntários abraçaram a causa e seguiram para este local para se situarem e começarem a fazer os devidos atendimentos.

No dia 18 de junho de 2010, a frente da comissão de comunicação do Conselho Regional de Psicologia levantei a bandeira em meu Estado para fazer uma mobilização, onde os psicólogos interessados poderiam fazer atendimentos voluntários na Ação Humanitária que realizamos nos oito municípios mais devastados pela enchente, onde mais parecia um “dilúvio alagoano”. Não tínhamos experiências, mas nos organizamos e tivemos coragem de seguir em frente para ajudar às vítimas da catástrofe.

As vítimas da inundação que aconteceu em nosso Estado, perderam praticamente tudo, objetos, histórias, o que construíram por toda vida. Não intensificando o grau do sofrimento; os jovens que se divertiam quando aconteceu a tragédia da boate não puderam sequer se defender, foram acurralados, em completo labirinto, se perderam nas chamas, na fumaça negra que os levaram até a morte.

Entre as duas tragédias, nada complementa o tamanho da dor; pois há até hoje em Alagoas um sentimento de luto, devastadas de suas histórias, dos seus sorrisos, das suas identidades, de suas alianças. Até hoje, há uma ruptura abrupta entre elas; quando não mais se percebiam em sua história, sequer entendem a formação do passado, presente e futuro, onde só restava o medo no olhar; carregando assim um luto coletivo, onde a cada semblante se perpetuava lágrimas permanentes. Mas, e agora? Não estamos falando mais de materiais, construções arquétipicas que simbolizam essas vidas, de memórias  e sim de perdas de pessoas que são eternamente presentes, de filhos, parentes, amigos. Ficam as coisas como lembranças, mas se vão o bem maior, que são as pessoas. Foram vidas, pessoas, gente, vínculos, amor, identidades…  Não há nada mais profundo, mais solitário do que presenciar tamanha dor, tamanho sofrimento. Isso não quer dizer que a tragédia de Alagoas foi menor e sim completamente diferente.

Com certeza a nossa profissão se faz preponderante neste processo de resgate pessoal. É importante assistir esta mobilização dos psicólogos do RS para o conforto inicial dessas vítimas que necessitam de ajuda; onde os Conselhos Regionais de Psicologia se unem em uma só voz para tentar através de sua categoria construir uma ponte no vazio dessas vítimas que se faz entre a saudade e o equilíbrio; entre o medo, desespero e a solidariedade; entre o vazio e a proteção dos profissionais que lutam para que esta sociedade se faça menos infeliz; entre a vida e a esperança; entre a fé e a realidade; entre o eu perdido e o encontro com os seus pedaços. Entre os sonhos destruídos e a certeza do encontro.

É fundamental o papel do CEREST (Centro de Referência  Regional em Saúde do Trabalhador) junto aos órgãos competentes em segurança do trabalho e os Órgãos públicos e privados (governamentais e não governamentais) prevenir e evitar acidentes como este, tragédias como esta, catástrofes irreparáveis.

É fundamental a presença de todas equipes técnicas de vigilância do trabalho, assim como profissionais de saúde,  psicólogos das emergências e desastres para que juntos possam ajudar aos nossos irmãos.

Para que tragédias como esta não mais aconteçam e assim termos o dissernimento para evitarmos acidentes que poderiam ser evitados, onde precisamos trabalhar em prol da prevenção,  da segurança, da paz, do amor, pela vida!

Não há outra saída e sem dúvida, previnir é a única opção, a única solução e o melhor remédio para a população!

Não há nada que repare essa dor, apenas o tempo servirá como mediador de uma eterna ponte que nos une aos inúmeros vazios. Não é fácil recomeçar! Não é fácil compreender! Não é fácil esquecer. Mas é preciso continuar pela mesma necessidade, pela essência de continuarmos existindo mediante a nossa sede de nos encontrar.

 

*Denise Moreira de Almeida Barbosa (CRP-15/2457)
É Conselheira do CRP-15, Psicóloga Clínica, Psicóloga do Trabalho, Psicopedagoga e doutoranda em Psicologia Social. Coordenadora do CEREST Regional de Maceió – SMS.